sábado, 1 de junho de 2019

Carta aos insanos...

Olá insanos,

Na última terça de maio vivemos um turbilhão de emoções (de novo). No palco, com uma plateia calorosa, viva, intensa. E agora, que acabamos de chegar em Junho sinto um desejo enorme de dizer algumas palavras sobre esse momento tão único: reviver o espetáculo Insanidade.
Alguns poderão dizer: "Mas já é a terceira vez pra você e para maioria de nós..."
Sim, eu sei. Nem por isso deixa de causar as borboletas no estômago próprias dos apaixonados.
Confesso.
Publicamente.
Escancaradamente
De cara limpa
Sou apaixonada por esse espetáculo e através dessa carta on line quero deixar registrado para a posteridade: já sinto saudade, mesmo antes de descer a escada ao final do espetáculo, guardando os objetos cênicos e figurinos no carro; despedindo de todos e apagando a luz. O coração fica miudinho já naquela música triste que toca após o: "Amor Insanidade" que todos gritamos juntos! E toda vez é a única, é a última - como bem disse nosso querido diretor, meu amigo Diego Maia, que sonhou comigo esse espetáculo desde os primeiros traços, desde os escritos ainda a mão e em cada troca de email ao escrever o roteiro juntos. Nem precisava pedir, professor: nós faríamos como se fosse a última. E a cada remontagem será intenso de novo. E forte! E emocionante!

Insanidade começou numa tarde de agosto de 2017, quando ao fim das audições, sentados informalmente analisando os escolhidos, Diego comentou comigo e professora Yara que gostaria de um espetáculo de Shakespeare, contemporaneizado, atualizado, que as pessoas pudessem se identificar de modo mais próximo e ao mesmo tempo que fosse fiel aos clássicos de Shakespeare. Seria estranho o desejo do gênio de nossos tempos, esse menino de coração gigante e homem valente, que aprendi a admirar... seria estranho se não fosse tão absolutamente possível quando a inspiração inicial veio. E ao ser apresentada, ainda em rabiscos tímidos, foi aceita com olhos brilhantes do parceiro Agente Maia, e foi sendo delineada entre um copo de café e outro, com muita pesquisa e conversas longas sobre a beleza e a dor de amar. E construímos juntos o texto, e aos poucos foi ganhando forma, e expressando exatamente a sintonia e maturidade da amizade dos roteiristas, e o prazer mútuo de fazer arte juntos. Concluso, o roteiro foi entregue em setembro do mesmo ano, e  o grande desafio de fazer tragédia pela primeira vez nos assustava muito, mas nossa confiança um no outro e com todo o suporte da UEG foram fundamentais, e assim: em novembro a estreia aconteceu, tendo no elenco (As mulheres: Ingrid, Isabelle, Maysa, Karol, Mirian e eu. Os homens: Vinicius, João e Guilherme): foi apresentada exclusivamente para os acadêmicos da UEG de Goianésia, através do Projeto UEG Cênica. E aqueles que viram pela primeira vez viajaram conosco, sob silêncio absoluto e com lágrimas nos momentos mais intensos. E confirmaram o que já imaginávamos, deixando a modéstia de lado: tínhamos criado uma obra de arte belíssima.

Em 2018, surgiu a oportunidade de reviver Insanidade em um Festival Cultural em Pirenópolis e nós topamos, com coração palpitando de embarcar nessa viagem de novo. E temerosos porque seria desafiador mais uma vez: tínhamos que encontrar outro casal pra representar Otelo e Desdêmona, outro ator pra interpretar Macbeth e outra Helena. Por razões diversas, os primeiros atores já não estavam conosco e tivemos medo de não conseguir encontrar artistas dispostos a topar conosco o desafio. Mas encontramos. De coração aberto, embora também temessem o tamanho da responsabilidade, tivemos o sim de Davi e Bruna (Otelo e Desdêmona), Douglas (Macbeth) e Cristiane (Helena). Ficando os demais mantidos em seus personagens originais: Isabelle (Lady Macbeth), Ingrid (Julieta), Vinicius (Romeu), Maysa (Anna) e eu (Letícia). Tivemos pouco tempo, e uma cirurgia de nossa Helena preocupou a todos, mas ela foi corajosa e se entregou a tal ponto, que mesmo de repouso pós operatório, enfrentou a viagem e se entregou a personagem, dando o melhor de si. E foi belíssima não só a atuação dessa menina extremamente dedicada, quanto a paixão de todo o elenco pelo espetáculo, que refletiu no resultado final: um sucesso!! Palco ao ar livre, focos que se moviam e sem tempo pra ensaiar com iluminação como devia, mesmo assim, encaramos de frente o desafio e entregamos o melhor possível, emocionando aos presentes e causando em nós a sensação deliciosa de dever cumprido.

E quando pensamos que a história de Insanidade já seria apenas memória, em 2019 surgiu a oportunidade de remontar o espetáculo. Agora sem o respaldo do Projeto de Extensão UEG Cênica,  que acabou junto com o término da graduação do Diego Maia. No entanto, o incentivo da UEG Goianésia se manteve, com apoio moral, espaço pra ensaio - salas de aula do Campus, e divulgação; além de conseguirem que as turmas de primeiro ano de história, pedagogia e administração fossem prestigiar, sendo que esse apoio fez toda a diferença. Contamos com apoios financeiros de alguns empresários, vendemos nós mesmos os ingressos, tivemos o contratempo do choque de datas com outro evento no local onde seria apresentado o nosso espetáculo - e pensamos várias vezes em desistir. Na antevéspera, nada era garantido, tivemos dificuldade para conciliar horários dos atores pro ensaio final, sofremos com medo de não dar tempo de ficar pronta a iluminação e figurino do espetáculo. Tivemos medo. Mas continuamos, com medo mesmo.
Afinal, apesar de todos os obstáculos e de tudo parecer dar errado, tínhamos um ao outro, de tal forma que o cuidado foi redobrado e nós soubemos entender-nos mutuamente. E depois de todos os contratempos, de tanta aflição, chegou o grande dia!!
Quando nosso diretor disse: "Deem o melhor de si! Concentrem! Divirtam-se! Está lotado lá fora!!"
Nós entramos no mundo mágico de Insanidade, como se hipnotizados e totalmente entregues. Foi de uma leveza e uma intensidade tamanhos, que ao final estávamos flutuando. 
E de bônus, tivemos a roda de conversa com profissionais de áreas diversas: Eduardo (educador e filósofo), Gil (assistente social) e Dra Jéssica (psicóloga) nos brindaram com fascinantes reflexões sobre o espetáculo, com seus olhares diversos e de uma maneira tão delicada, que ficou claro a cada espectador a proposta. Foi um momento memorável e valeu a pena cada minuto dedicado a sua preparação e realização. E pra fechar com chave de ouro a cesta brinde da Cacau Show foi sorteada e entregue, as fotos e o carinho foram recebidos e a cortina fechou, definitivamente.
Tínhamos que ir. Já não havia nada a fazer ali...
Já não podíamos viver no faz de conta de Insanidade, mas com os efeitos desse espetáculo em nós.
E essa carta longa é minha maneira de agradecer aos que sonharam conosco esse sonho, aos que dedicaram suas horas em ensaios, aos que se apaixonaram conosco pela obra, pela arte...

Meus queridos insanos...
eu precisei fazer uma retrospectiva das três viagens ao maravilhoso mundo de Insanidade que foram realizadas, para que entendessem quão diversos são os desafios de um mesmo espetáculo. Para que refletissem sobre o quanto é sério fazer arte. Para que lembrem sempre quanto são imprescindíveis, que suas atuações ficarão para sempre em nossas memórias, e daqueles que contemplaram Insanidade.
Esse não é um espetáculo pra entreter. É pra instigar. Pra proporcionar reflexão. Pra "abalar as estruturas"...
Vocês foram responsáveis, corajosos, zelosos e delicados conosco e uns com os outros. E isso é que de fato fica. O prazer de dividir Insanidade (antes um sonho meu e do Diego) com vocês, e com o público é inenarrável, e talvez eu tenha perdido meu tempo nessas linhas de palavreado inútil que não alcança nem de longe o quanto amo fazer arte, e quanto amei fazer arte com vocês. 


Talvez, de fato, tenha sido essa nossa última vez juntos. Nesse espetáculo.
Talvez, ele fique somente nas memórias até ser deletado completamente pelo implacável tempo.
Talvez por isso eu tenha preferido essa carta fixa, a postar no stories por 24 horas apenas.
Se for assim, se tudo que tenho for a história que logo vira passado distante, então, a cada vez que lerem essas linhas, saberão que fizemos história.
E não foi pelos grandes atos.
Foi pelo amor que colocamos neles.

Obrigada Insanos.
E parafraseando Montenegro:
Que a nossa loucura seja perdoada...
porque metade de nós é amor, e a outra metade, também!!